Álvaro Semedo, filho de Fernão Gomes Semedo e de Leonor Vaz Forçada, nasceu em Nisa, próximo de Portalegre, em Julho ou Agosto de 1585, e foi baptizado no dia 8 deste último mês. Sobre a infância de Álvaro Semedo não há muita informação. Aos dezasseis anos, a 30 de Abril de 1602, Semedo ingressou no noviciado da Companhia de Jesus, no Colégio do Espírito Santo de Évora, onde completou os três anos do curso de filosofia e o primeiro ano do curso de teologia, e, no dia 20 de Março de 1608, deixa Lisboa, na nau Nossa Senhora do Vencimento, chegando, ainda nesse ano, a Goa, onde continuou os seus estudos de teologia, sendo, em 1611, ordenado sacerdote, aos vinte e seis anos de idade. Em finais do mesmo ano, ou tal vez já em 1612, Semedo partiu de Goa para Macau, onde foi designado para a missão da China pelo visitador Francesco Pasio. Semedo entrou na missão da China em 1613, e foi para Nanjing, na China continental, estudou chinês e adoptou o nome nativo de Xie Wulu.Em 1616, Shen Que, o vice-ministro dos Ritos de Nanjing, perseguiu os cristãos, entre os quais por Álvaro Semedo e Alfonso Vagnoni. O próprio Semedo dá conta da crueldade para com os missionários, que chegaram a temer pela vida: “A maior balbúrdia foi em Nankim, onde chegado o correio, quis ele mesmo dar a notícia aos expulsados padres, considerando suma graça o não terem sido condenados a serem cortados em pedaços, motivo por que os mandarins os visitaram com grandíssimas honras e congratulações. Aos seis de Março foram os padres conduzidos, primeiramente, para um tribunal de seis mandarins, a fim de serem interrogados, depois de terem sido denunciados pelo Xin, com canga ao colo, sendo o padre Semedo conduzido numa tábua, por não poder estar de pé, devido ao seu estado de fraqueza. Após um outro interrogatório setenciaram que, se bem que merecessem a morte por pregarem na China uma lei nova, davam-lhes, porém, a vida, por clemência do rei, sendo, porém, cada um bastonado con dez golpes e, assim, fossem enviados para os seus países” (Semedo, Relação, p. 368). Nesta ocasião, ao contrário de Álvaro Semedo, que não sofreu bastonadas «por este se encontrar em muito mal estado» (Semedo, p. 368), Alfonso Vagnoni foi atacado «de forma a ficar mal, durante um mês, sem que as chagas pudessem fechar», tendo posteriormente sido presos. Finalmente, em 1617, os padres saíram de Nanjing para o desterro «transportados em jaulas, trinta dias, até que chegaram à primeira cidade da província de Cantão» (pp. 368-369. Depois de julgados, os missionários «foram, finalmente, retirados das jaulas, e alguns dias depois, enviados para Macau» (Semedo, p. 369), onde Semedo continuou com o estudo da língua chinesa. Em 1620, sob o novo nome de Zeng Dezhao, Álvaro Semedo entrou novamente na China continental e passou a residir principalmente em Hangzhou, na província de Zhejiang, onde desenvolveu uma intensa actividade missionária e teve oportunidade de viajar e visitar outros lugares da China nos dezassete anos seguintes, adquirindo um conhecimento alargado sobre a China Ming. Visitou as província de Zhejiang, Jiangnan, Jiading e de Jiangxi, e viveu em Xangai. Em 1628 passou para Xi´an, na província de Shaanxi, onde, em 1625, tinha sido descoberta a famosa inscrição da estela nestoriana. Semedo foi o primeiro europeu a examinar a inscrição, e enviou uma xilogravura e uma tradução aos seus companheiros da capital. Em Xi´an viveu com Adam Schall von Bell, e ficou nessa cidade até 1630, para depois voltar para a província de Jiangxi, onde se estabeleceu na cidade de Nanchang. Finalmente, em finais de 1635, efectuou uma curta viagem à Cochinchina, pouco antes de ser nomeado procurador da Vice-Província da China, em 1636, e partir para Macau. Em 1637, Semedo, já como procurador, viajou de Macau para a Europa, visitou Goa em 1638, e chegou a Lisboa no início de 1640. Nesse período, e até ao seu regresso à China, em 1645, visitou várias cidades europeias e também terminou o texto que publica, em Madrid, no ano de 1642, com o título Imperio de la China i cultura evangélica en él. Durante a viagem de regresso, em 1644, Semedo parou em Goa e chegou a Macau em 1645, onde permaneceu até até 1648, sendo designado vice-provincial da China, cargo que desempenhou até 1650. Nos inícios de 1648, já como vice-provincial, partiu, com Andreas Koffler, para Zhaoqing, onde estava, na altura, a corte dos Ming do Sul, sendo a região um dos últimos focos de resistência à conquista manchu. O imperador Yongli recebeu Semedo, que teve a ocasião de celebrar uma missa para a corte. Depois de uma breve estada na cidade, Semedo partiu para Cantão, onde, em 1649, substitui o falecido Francesco Sambiasi, assistiu à segunda tomada da cidade de Cantão pelos Qing, em finais de 1650, durante a qual foi feito prisioneiro pelos manchus, sendo libertado após um eunuco dos manchus, Miguel, o reconhecer como um dos companheiros de Adam Schall von Bell, presidente do Tribunal das Matemáticas em Beijing desde 1645.
Em 1653 voltou mais uma vez para Macau, e, em 1654, partiu para Hangzhou para substituir Manuel Dias junior como vice-provincial da China, desempenhando esse cargo pela segunda vez, entre 1654 e 1657, ano em que foi substituído por Simão da Cunha e em que voltou para Cantão, onde faleceu, em 1658, depois de um período de doença, após uma permanência na missão da China de quarenta e cinco anos.
Bibliografia
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Pina, Isabel, «The European Circulation of Álvaro Semedo´s Work», in Luís Filipe Barreto e Wu Zhiliang (eds.), China-Macau and Globalizations: Past and Present, Lisboa, Centro Científico e Cultural de Macau, I.P.-Fundação Macau, 2016, pp. 90–103;
Pina, Isabel,, «Escrever sobre a China no Século XVII: Álvaro Semedo e a Obra Imperio de la China», in Carlos Morais, et al. (eds.), Diálogos Interculturais Portugal-China 1, Aveiro, Universidade de Aveiro, 2018, pp. 99-119;
Pina, Isabel, «Representations of China in Álvaro Semedo’s Work», in Luís Saraiva e Catherine Jami (eds.), History of mathematical Sciences: Portugal and East Asia V – Visual and Textual Representations in Exchange between Europe and East Asia 16th-18th Centuries, Singapura, World Scientific Publishing Company, 2018, pp. 31–53.
Semedo, Álvaro Relação da Grande Monarquia da China, trad. Luís Gonzaga Gomes, Macau, Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, Fundação Macau, 1994.
Zhang, Minfen, «O Pe. Álvaro Semedo e a sua Relação da Grande Monarquia da China», Revista de Cultura, Série III, n. 24, 2007, pp. 132–140.
Miguel Frías Hernández