Ibn Darrāj al-Qastallī (958-1008) é dos primeiros poetas luso-árabes de que há registo. Nascido em Cacela (Algarve), o seu elevado estatuto enquanto poeta (ao serviço de Almançor) permitiu-lhe viajar por terras do al-Andalus (Córdova, Santiago de Compostela, Valência, Denia, Saragoça) e do Magrebe (Ceuta). Com cerca de trinta anos, viaja de Cacela rumo a Córdova com o objectivo de conseguir afirmar-se como poeta de Corte, projecto que lhe proporcionaria fazer muitas outras viagens. Depois de avaliado o seu talento como poeta, Ibn Darrāj entra ao serviço de Almançor, tornando-se poeta do Estado Amirida. A sua poesia e as suas cartas, das quais restam apenas fragmentos, demonstram a importância das suas viagens no al-Andalus e no Norte de África, tendo contribuído para a propaganda das batalhas de Almançor. Como afirma Ahmed Tahiri, a partir dos biógrafos do poeta e de outro estudos, foi a partir de então que Ibn Darraj compôs poemas panegíricos sobre Almançor, exaltando as suas virtudes, não prescindindo de o acompanhar na suas guerras e incursões (Tahiri, 2009:78). O poema traduzido por Adalberto Alves veicula o espírito de aventura e a determinação de Ibn Darrāj, mostrando que nem a família o demoveria: “ensinaram-me a temer longas viagens,/mas são o meio de beijar a mão de Almançor./[…] nem meu filho das entranhas/fizeram que desistisse/e na ânsia da viagem/eis que, por fim,/eu parti” (Alves, 1999:158). Ibn Darrāj al-Qatallī foi comparado, ainda em vida, com o poeta al-Mutanabbī; daí a alcunha “al-Mutanabbī do Ocidente”. Na sequência da função como poeta da Corte, a sua antologia, para além da temática floral, trata essencialmente das campanhas militares empreendidas por Almançor, e, após a morte deste último, Ibn Darrāj al-Qastallī continuou ao serviço do Estado Amirida junto de Abd al-Malik. O poeta foi um dos grandes viajantes medievais do Gharb al-Andalus devido à posição que ocupava na Corte, confessando, através da sua escrita, as adversidades e dificuldades que enfrentara ao viajar: “tive, em vez de uma longa vida de doçura,/a travessia de vales e montes lamacentos;/em vez de noites breves sob véus/o temor da viagem no seio de infindável treva;/em vez de água límpida sob sombras/o fogo das entranhas queimadas pela sede;/em vez do perfume errante das flores/o hálito esbraseado do meio-dia;/em vez da intimidade entre ama e amiga/a rota nocturna cercado de lobos e de génios/em vez do espectáculo dum rosto gracioso/desgraças suportadas com nobre constância” (Alves, 1999:161).
Bibliografia Adalberto Alves, O Meu Coração É Árabe, 1999; Ahmed Tahiri, Cacela e o seu Poeta Ibn Darraj al-Qastalli na História e Literatura do Al-Andalus, 2009.
Natália M. Lopes Nunes