A CRISE AGRÍCOLA NESTE CONCELHO
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Título
A CRISE AGRÍCOLA NESTE CONCELHO
Criador
S/ autor
Fonte
O Jornal de Cantanhede, n.º 11, pág. 2, col. 1,2,3
Data
08-09-1889
Colaborador
Pedro Barros
Text Item Type Metadata
Text
Tão excepcionais são os tempos que vão correndo, tão crítico é o momento actual que a todos em alguma conta os interesses agrícolas deste concelho cumpre trabalhar em prol da causa comum, sugerindo alvitres, e apontando defeitos, propondo ou iniciando melhoramentos que tendam a salvar tanto o proprietário como o operário, dos efeitos inevitáveis é perniciosos desta crise que, não sendo combatida a tempo, levará fatalmente a ruína a muitos proprietários e a desgraça e miséria a numerosíssimas famílias da classe proletária. Com que original indiferença temos assistido a essa nova espécie de escravatura — a escravatura branca — que nos rouba os melhores braços do nosso corpo agrícola, acarretando para as fertilíssimas e imensas regiões da América do Sul, pais, filhos, famílias inteiras as quais a sacra fames auri cega, alucina e faz perder o amor da pátria, deste jardim da Europa à beira-mar plantado, onde a felicidade e a fortuna também existem e também podem ser auferidas desde o momento que a agricultura se preste todo o apoio, logo que governantes e governados, à semelhança de outras nações se compenetrem de que é esta a primitiva eterna e a inexaurível fonte dos nossos recursos materiais! Com que desleixo, que chega quase a ser crime de lesa sociedade, olhamos para ruína da principal fonte agrícola deste concelho! Como assistimos indolentes e impassíveis a essa devastação progressiva dos nossos vinhedos a esse grande mal que caminha a passos agigantados para a extinção completa desse ramo da agricultura que devia merecer todos os nossos desvelos, toda a nossa solicitude.
Como é triste e desolador o espectáculo que nos oferecem esses grandes tractos de terreno onde ainda há pouco se admirava uma vegetação abundante, uma cultura tão produtiva, e agora ……. Silvas e abrolhos, uma vegetação raquítica, plantas cloróticas e contaminadas do flagelo, terrenos enfim, que parecem ter sido roçados pelas asas da maldição!
E não serão estas calamidades suficientes para nos incitar á defesa? Que temos feito para as evitar, para as combater? Que congressos temos celebrado ou a que temos assistido tendentes a remediá-los? Quais as providências do governo que para nós se traduzissem em factos de real e incontestável utilidade prática? Qual a nossa iniciativa e quais os nossos esforços para secundar as providências do governo?
Mal avisado andará, a nosso ver, quem julgar suficientes e inteiramente profícuas as medidas adoptadas pelo governo com o fim de melhorar as nossas difíceis condições agrícolas; assim como seria loucura supor que tais medidas podem atingir o desideratum sem uma acção enérgica e metódica da nossa parte, da parte de todos os proprietários e lavradores. É tempo de pôr de parte essa rotina insensata e tradicional' que nos escraviza e avilta, que nos fecha os olhos aos benefícios do progresso, que nos faz caminhar na retaguarda dos povos civilizados; é tempo que os proprietários e lavradores deste concelho, sem distinção de classe, isentos de paixões partidárias e sem outro intuito que não seja o dos nossos interesses agrícolas, se unam numa só vontade, empenhando todos os seus esforços para salvarem este concelho desse mal inevitável — a ruina agrícola — e que quanto mais tarde mais difícil de remediar.
Forme-se uma sociedade, um agrupamento, um centro agrícola que perante o governo defenda os nossos interesses, solicitando providências enérgicas e eficazes, que exija um apoio decidido e desassombrado à agricultura deste concelho e que pela sua parte, secundando arrojadamente os esforços do governo, dirija os melhoramentos que a presente situação agrícola está reclamando com urgência. Lancem-se as vistas para o tratamento dos actuais vinhedos por adubos e remédios reputados mais profícuos, ou para a sua substituição por videiras resistentes, como são segundo a natureza dos terrenos, as Riparias, Jacquez, Solonis, Black, - July, Taylor, Rupestris, etc; não se desprezem outras culturas, como a do tabaco nas regiões apropriadas e a olivicultura, ou outras indústrias como a cerealífera, a criação de gados, os lacticínios, etc. É preciso sairmos desta apatia mortal, deste indiferentismo mórbido que parece peculiar da nossa raça; não esperemos de braços cruzados que a cornucópia da Previdência derrame sobre nós o maná dos melhoramentos e benefícios agrícolas, pensemos um pouco nesta crise que atravessamos, pensemos um pouco no futuro que nos espera e decidamo-nos a entrar nos resolutamente na luta; não é uma luta pela existência mas é uma luta pelos nossos interesses agrícolas e dos quais também depende aquela.
Aos que, pela sua inteligência ou estado social, ou pelos conhecimentos especiais sobre este assunto mais aptos estão para compreender e resolver o problema, a eles compete principalmente tomar a iniciativa e dar o exemplo. E felizmente que neste concelho não falta quem tenha competência, energia e abnegação para tal empresa. A uns e outros não lhes serão, por certo, regateados louvores merecidos, nem lhes escasseará o auxilio indispensável de todos os que vêem mais ou menos directamente comprometidos os seus interesses agrícolas, e particularmente a viticultura. Sendo nós os primeiros a levantar aqui a voz a favor de uma causa tão justa, julgamos prestar assim um bom serviço a todo o concelho, e restar-nos-á ao menos a consolação de não autorizarmos com o nosso silêncio um indiferentismo que tão funesto nos pode vir a ser.
Como é triste e desolador o espectáculo que nos oferecem esses grandes tractos de terreno onde ainda há pouco se admirava uma vegetação abundante, uma cultura tão produtiva, e agora ……. Silvas e abrolhos, uma vegetação raquítica, plantas cloróticas e contaminadas do flagelo, terrenos enfim, que parecem ter sido roçados pelas asas da maldição!
E não serão estas calamidades suficientes para nos incitar á defesa? Que temos feito para as evitar, para as combater? Que congressos temos celebrado ou a que temos assistido tendentes a remediá-los? Quais as providências do governo que para nós se traduzissem em factos de real e incontestável utilidade prática? Qual a nossa iniciativa e quais os nossos esforços para secundar as providências do governo?
Mal avisado andará, a nosso ver, quem julgar suficientes e inteiramente profícuas as medidas adoptadas pelo governo com o fim de melhorar as nossas difíceis condições agrícolas; assim como seria loucura supor que tais medidas podem atingir o desideratum sem uma acção enérgica e metódica da nossa parte, da parte de todos os proprietários e lavradores. É tempo de pôr de parte essa rotina insensata e tradicional' que nos escraviza e avilta, que nos fecha os olhos aos benefícios do progresso, que nos faz caminhar na retaguarda dos povos civilizados; é tempo que os proprietários e lavradores deste concelho, sem distinção de classe, isentos de paixões partidárias e sem outro intuito que não seja o dos nossos interesses agrícolas, se unam numa só vontade, empenhando todos os seus esforços para salvarem este concelho desse mal inevitável — a ruina agrícola — e que quanto mais tarde mais difícil de remediar.
Forme-se uma sociedade, um agrupamento, um centro agrícola que perante o governo defenda os nossos interesses, solicitando providências enérgicas e eficazes, que exija um apoio decidido e desassombrado à agricultura deste concelho e que pela sua parte, secundando arrojadamente os esforços do governo, dirija os melhoramentos que a presente situação agrícola está reclamando com urgência. Lancem-se as vistas para o tratamento dos actuais vinhedos por adubos e remédios reputados mais profícuos, ou para a sua substituição por videiras resistentes, como são segundo a natureza dos terrenos, as Riparias, Jacquez, Solonis, Black, - July, Taylor, Rupestris, etc; não se desprezem outras culturas, como a do tabaco nas regiões apropriadas e a olivicultura, ou outras indústrias como a cerealífera, a criação de gados, os lacticínios, etc. É preciso sairmos desta apatia mortal, deste indiferentismo mórbido que parece peculiar da nossa raça; não esperemos de braços cruzados que a cornucópia da Previdência derrame sobre nós o maná dos melhoramentos e benefícios agrícolas, pensemos um pouco nesta crise que atravessamos, pensemos um pouco no futuro que nos espera e decidamo-nos a entrar nos resolutamente na luta; não é uma luta pela existência mas é uma luta pelos nossos interesses agrícolas e dos quais também depende aquela.
Aos que, pela sua inteligência ou estado social, ou pelos conhecimentos especiais sobre este assunto mais aptos estão para compreender e resolver o problema, a eles compete principalmente tomar a iniciativa e dar o exemplo. E felizmente que neste concelho não falta quem tenha competência, energia e abnegação para tal empresa. A uns e outros não lhes serão, por certo, regateados louvores merecidos, nem lhes escasseará o auxilio indispensável de todos os que vêem mais ou menos directamente comprometidos os seus interesses agrícolas, e particularmente a viticultura. Sendo nós os primeiros a levantar aqui a voz a favor de uma causa tão justa, julgamos prestar assim um bom serviço a todo o concelho, e restar-nos-á ao menos a consolação de não autorizarmos com o nosso silêncio um indiferentismo que tão funesto nos pode vir a ser.
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Citação
S/ autor, “A CRISE AGRÍCOLA NESTE CONCELHO ”. In O Jornal de Cantanhede, n.º 11, pág. 2, col. 1,2,3, 08-09-1889 . Disponibilizado por: Pragas nos Periódicos, acedido 30 de Novembro de 2024, http://fcsh.unl.pt/pragasnosperiodicos/items/show/229.