QUESTÃO VINÍCOLA
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Título
QUESTÃO VINÍCOLA
Criador
S/ autor
Fonte
O Jornal de Cantanhede, n.º 48, pág. 1, col. 4, pág. 2, col. 1,2,3
Data
18-05-1890
Colaborador
Pedro Barros
Text Item Type Metadata
Text
O mais lúcido e prático estudo que conheço sobre a utilização, tratamento, etc., dos porta-enxertos americanos é a interessantíssima brochura do Sr. Poitou, conselheiro geral de Bordéus, que soube condensar em poucas páginas tudo quanto o vinhateiro deve saber nesta especialidade. Consta-me que vai em breve aparecer uma tradução portuguesa deste trabalho, cuja 4.ª edição se acha esgotada em França, e que tem sido trasladado para todas as línguas. Não posso assaz recomendar a leitura e o estudo atento, deste pequeno Guia do vinhateiro, que deve fazer parte da biblioteca de todo o proprietário de vinhas. Mas, se entre nós a opinião parece compreender a urgência de uma defesa enérgica contra o destruidor insecto, onde me parece haver hesitação, se não incúria e desordem, é na aplicação dos remédios contra o míldio, no qual o produtor não deve hesitar em reconhecer um inimigo tão perigoso conto a filoxera e talvez mais traiçoeiro. A ideia da impreterível necessidade de um tratamento preventivo parece não se ter ainda radicado no espírito de todos que possuem os recursos necessários para o empregar; e, todavia, é indispensável que essa ideia se imponha: todas as convicções. Esperar que o mal se manifeste, para o combater, é correr o risco perder o doente desperdiçar remédio. Os partidários da dosagem reduzida do caldo bordelês continuam satisfeitos com a aplicação da sua fórmula, que é, como se sabe, 1,5 kg de sulfato de cobre e 500 gramas de cal gorda em pedra, por 400 litros de água. Esta redução tem a grande vantagem de baratear consideravelmente o remédio e de facilitar, portanto, a sua difusão.
Como não faltam em Portugal hesitantes, ou mesmo incrédulos, no que diz respeito à necessidade de combater preventivamente o míldio julgo dever traduzir aqui estas linhas que contêm ao mesmo tempo uma esperança e um conselho. São extraídas do relatório apresentado pelo Sr. Tisserand, director geral da agricultura, na sessão da comissão superior da filoxera em 3 do Fevereiro de 1890, documento a que já por várias vezes aludi no decurso destas páginas: «O míldio, que se mostrava outrora tão ameaçador, já nos não inquieta. Está vencido. O emprego dos sais de cobre generalizou-se de um modo notável, inesperado, poderia eu dizer, e os viticultores consentem de tanto melhor vontade na sua aplicação quanto dela auferem resultados imediatos. Com efeito, nos dois últimos anos, em toda a parte onde o uso dos sais de cobre se fez racionalmente
e em tempo oportuno, a colheita ficou indemne, a cepa amadureceu enquanto nos vinhedos abandonados ou mal cuidados viram os cultivadores perdidas as colheitas e aniquiladas as brilhantes esperanças da Primavera. Estes terríveis desastres encerram uma lição salutar, e está próximo o momento em que nenhum vinhateiro hesitará em se impor um leve sacrifício para salvar a sua colheita. É incontestável que daqui a pouco, assim como o enxoframento contra o oídio, os tratamentos cúpricos figurarão permanentemente entre as diversas operações que a vinha reclama cada ano.»
Nada do que aqui fica escrito é novidade para os técnicos e para os eruditos; mas este relatório não tem a ridícula pretensão de se adiantar ao saber real e profundo dos que diariamente se entregam ao estudo destas graves questões. Propõe-se unicamente a contribuir para a vulgarização das ideias gerais, que são o ponto de partida do grande movimento de regeneração e de defesa iniciado na nossa viticultura, e das quais é mister continuar a veemente propaganda. Um erro, em que frequentemente incorrem os espíritos de eleição, é o suporem que as verdades que se lhes antolham luminosas e de uma irrecusável evidência são da mesma forma e com a mesma rápida lucidez assimiladas pelas inteligências comuns e incultas; quando é justamente nestas que o espirito de rotina, o instinto da desconfiança, o hábito do desleixo se opõem, com a mais surda inercia, à aceitação das ideias mais justas e das mais flagrantes evidências. A nossa viticultura, infelizmente, não está apenas nas mãos de homens superiormente educados e de cérebro aberto a todas as formas de progresso, embora os haja, e muitos, no Portugal moderno. Destes não curo eu, por saber que podem prescindir de exortações e de conselhos, e que se bastam a si próprios. Mas, para que as elementares indicações, que ali firam exaradas, e a conveniência inadiável da sua aplicação penetrem na massa profunda da nossa população vinhateira, não é talvez de todo inútil que eu as repita depois de muitos, e que muitos a repitam ainda depois de mim. É desta forma que as ideias úteis fazem o seu caminho, e a melhor, a mais fértil propaganda, não é afinal senão a repetição até à saciedade das verdades que convém fazer triunfar.
Como não faltam em Portugal hesitantes, ou mesmo incrédulos, no que diz respeito à necessidade de combater preventivamente o míldio julgo dever traduzir aqui estas linhas que contêm ao mesmo tempo uma esperança e um conselho. São extraídas do relatório apresentado pelo Sr. Tisserand, director geral da agricultura, na sessão da comissão superior da filoxera em 3 do Fevereiro de 1890, documento a que já por várias vezes aludi no decurso destas páginas: «O míldio, que se mostrava outrora tão ameaçador, já nos não inquieta. Está vencido. O emprego dos sais de cobre generalizou-se de um modo notável, inesperado, poderia eu dizer, e os viticultores consentem de tanto melhor vontade na sua aplicação quanto dela auferem resultados imediatos. Com efeito, nos dois últimos anos, em toda a parte onde o uso dos sais de cobre se fez racionalmente
e em tempo oportuno, a colheita ficou indemne, a cepa amadureceu enquanto nos vinhedos abandonados ou mal cuidados viram os cultivadores perdidas as colheitas e aniquiladas as brilhantes esperanças da Primavera. Estes terríveis desastres encerram uma lição salutar, e está próximo o momento em que nenhum vinhateiro hesitará em se impor um leve sacrifício para salvar a sua colheita. É incontestável que daqui a pouco, assim como o enxoframento contra o oídio, os tratamentos cúpricos figurarão permanentemente entre as diversas operações que a vinha reclama cada ano.»
Nada do que aqui fica escrito é novidade para os técnicos e para os eruditos; mas este relatório não tem a ridícula pretensão de se adiantar ao saber real e profundo dos que diariamente se entregam ao estudo destas graves questões. Propõe-se unicamente a contribuir para a vulgarização das ideias gerais, que são o ponto de partida do grande movimento de regeneração e de defesa iniciado na nossa viticultura, e das quais é mister continuar a veemente propaganda. Um erro, em que frequentemente incorrem os espíritos de eleição, é o suporem que as verdades que se lhes antolham luminosas e de uma irrecusável evidência são da mesma forma e com a mesma rápida lucidez assimiladas pelas inteligências comuns e incultas; quando é justamente nestas que o espirito de rotina, o instinto da desconfiança, o hábito do desleixo se opõem, com a mais surda inercia, à aceitação das ideias mais justas e das mais flagrantes evidências. A nossa viticultura, infelizmente, não está apenas nas mãos de homens superiormente educados e de cérebro aberto a todas as formas de progresso, embora os haja, e muitos, no Portugal moderno. Destes não curo eu, por saber que podem prescindir de exortações e de conselhos, e que se bastam a si próprios. Mas, para que as elementares indicações, que ali firam exaradas, e a conveniência inadiável da sua aplicação penetrem na massa profunda da nossa população vinhateira, não é talvez de todo inútil que eu as repita depois de muitos, e que muitos a repitam ainda depois de mim. É desta forma que as ideias úteis fazem o seu caminho, e a melhor, a mais fértil propaganda, não é afinal senão a repetição até à saciedade das verdades que convém fazer triunfar.
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Citação
S/ autor, “QUESTÃO VINÍCOLA”. In O Jornal de Cantanhede, n.º 48, pág. 1, col. 4, pág. 2, col. 1,2,3 , 18-05-1890 . Disponibilizado por: Pragas nos Periódicos, acedido 27 de Novembro de 2024, http://fcsh.unl.pt/pragasnosperiodicos/items/show/271.