Pragas nos Periódicos

CASTELO BRANCO. GAFANHOTOS

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Título

CASTELO BRANCO. GAFANHOTOS

Criador

S/ autor

Fonte

A DEFESA DA BEIRA, n.º 396, pág. 1, col. 1,2

Data

27-04-1902

Colaborador

Pedro Barros

Text Item Type Metadata

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Quando, no ano passado, apareceu nos subúrbios desta cidade a guarda avançada do invasor exército acridiano, nós fomos dos primeiros que quisemos ir ao campo de bivaque apreciar o estado de apresentação das tropas insectíferas…
E fomos numa bela tarde, por sinal, em delicioso passeio com alguns amigos, curiosos como nós. Os campos invadidos, então, eram os que marginam o caminho que da Senhora da Piedade conduz a Senhora Sant´Ana.
Era lindo — porque deixar de confessá-lo? O alar daqueles milhares de insectos, cujas asitas refulgiam ao sol, pondo no ar um espectáculo agradável à vista. À medida que caminhávamos pelo campo víamos levantar diante de nós cerradas nuvens de gafanhotos. Quando parávamos ouvia-se nítido, distintamente, o ruído dos acrídios trilhando os pastos, ruído que semelhava o raspar da vassoura municipal nas nossas calçadas…
Era soberbo, - mas era desolador também porque aqueles insectos, em vilegiatura pela raia, onde já haviam feito prejuízos enormíssimos, vinham na sua digressão aos nossos campos lançar no terror os proprietários desta região.
Felizmente, no dia seguinte, o exército acridiano desaparecia, com geral satisfação de todos.
Isto no ano passado.
Este ano, ao que parece, e em quantidade assustadora, os gafanhotos apareceram mais cedo.
Todo o país se lamenta amargamente da nefasta invasão. O governo, vendo perigar a agricultura do país, decretou uma medida geral de extinção e deu, aos seus delegados nas províncias, ordens terminantes para a integral e rigorosa execução desse decreto.
Neste concelho, e principalmente nesta cidade, vai um verdadeiro ferret opus por causa dos gafanhotos.
Infelizmente o decreto não é cumprido com rigor, como passamos a demonstrar:
O § 2.° do art.º 1.° do regulamento diz que só deverão ser chamados a prestar serviços nos campos invadidos os indivíduos de 18 a 50 anos de idade.
Não se tem respeitado esta prescrição, porque nos consta que indivíduos de mais de 50 anos de idade foram já intimados e obrigados a trabalharem ou remirem-se.
Se é necessário que a lei seja cumprida com rigor, não é menos necessário que ela não seja exorbitada.
Mais:
Tem-se cumprido o art.º 5.°, que diz que os proprietários são obrigados a aumentar o pessoal até à integração de um homem por 20 hectares de superfície invadida?
É necessário que o seja, e com rigor, para se evitar que sejam chamados a prestar serviço indivíduos a quem essas propriedades não interessam directamente.
Para isso chamamos a atenção do Sr. Sá Viana.
Os proprietários das propriedades na Pedra da Garalheira têm ao seu serviço um indivíduo por cada 20 hectares de terreno?
Se têm, está muito bem, mas se não têm obriguem-nos a isso sejam eles quem forem, gregos ou troianos.
O Sr. Presidente da câmara convidou no princípio da semana passada alguns proprietários a reunirem nos paços do município para resolverem a forma de extinguirem os gafanhotos.
É curioso isso! Não são porventura, pelos artigos 2.°, 3.° e 4.°, os proprietários obrigados a procederem à extinção dos acrídios nas suas propriedades e a prestarem serviço nas propriedades vizinhas invadidas quando as suas não estejam?
Mas resolver o quê, se aqui nada a resolver e há só a cumprir?
O decreto de 20 de Fevereiro de 1902 é explícito e não admite dúvidas!
Para que foi então aquela reunião, onde, afinal, nada se resolveu e nada se alvitrou que não fosse o que está decretado?
Não se chega a atingir facilmente a preocupação do Sr. Presidente da câmara…
Sempre foi uma reunião de onde todos saíram com as ideias com que entraram!
Seria muito louvável a convocação de qualquer reunião antes da publicação do decreto. Depois, não, porque a papinha tinha-a manipulado o governo e o que tinham a fazer os proprietários era comê-la…
Mais nada.
Os gafanhotos — estamos a vê-lo — vão dar assunto para comentários.
Mau será se assim for, porque é sinal de que eles não desaparecem, nem à mão de Deus Padre, nem aos esforços do Sr. Viana!

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Citação

S/ autor, “CASTELO BRANCO. GAFANHOTOS”. In A DEFESA DA BEIRA, n.º 396, pág. 1, col. 1,2 , 27-04-1902. Disponibilizado por: Pragas nos Periódicos, acedido 30 de Novembro de 2024, http://fcsh.unl.pt/pragasnosperiodicos/items/show/579.

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