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Fev
Camilo Castelo Branco: 200 anos
Bibliotecas NOVA FCSH
Todo o dia (10 Fev a 16 Mar 2025)
Av. de Berna

Nos 200 anos do nascimento de Camilo Castelo Branco, as Bibliotecas NOVA FCSH assinalam a data com uma mostra bibliográfica patente no átrio da Torre B, onde se podem encontrar vários dos títulos da sua autoria e, também, estudos sobre a sua obra e vida.

O Primeiro Romancista Português

Numa carta ao editor António Maria Pereira, datada de 1862, Camilo escrevia estas palavras lastimosas: “Vexo-me de estar pobre, e de ser a irrisão dos que me chamam primeiro romancista como ao Cristo chamavam rei da Judeia. É uma ironia honorífica.” A lamentação envolve dinheiro: remuneração do trabalho de escrita. É sabido que Camilo foi o primeiro escritor português a viver da escrita, o que em parte explica a sua extensa obra, também das mais variadas em géneros e modalidades de publicação. Mas aquelas palavras mostram também que, naquele momento — com apenas 37 anos —, Camilo beneficiava já de grande prestígio literário. Chamarem-lhe alguns o primeiro romancista  era sinal da percepção de que Camilo introduzira já na literatura portuguesa coisa de grande monta: nada menos do que o romance moderno.

De facto, ser o primeiro escritor a viver das letras é significativo por se tratar de um romancista que, praticamente sozinho, impôs o romance como género dominante no espaço literário português e caracterizou a especificidade da figura do romancista:  no romanesco de Camilo, romancista e personagens habitam o mesmo mundo, porque esse mundo é definido como um mundo em que coexistem os romances e o romancista, cujo ofício é escrevê-los. Desse ofício, Camilo ressalta a competência de escrita e imaginação, mas também a ideia crucial de que o romance não é um género entre outros, mas o género caracterizado pela liberdade e pela dimensão pública democrática. Camilo repetiu muitas vezes que os seus romances não tinham nenhum intuito de moralizar ou de melhorar o mundo. Esse desígnio moralizador, nunca o considerou fonte de legitimidade das ficções que expedia a bom ritmo para quem as quisesse ler: caberia aos leitores a responsabilidade de fazer com elas o que entendessem.

Por outro lado, Camilo nunca deixou de enfrentar a brutalidade do mundo, intransigente com a estupidez e a ignorânca, intolerante com a arrogância dos poderes e a violência. Obras como Amor de Perdição, A Queda dum Anjo, Novelas do Minho ou A Brasileira de Prazins, entre tantas, são testemunho eficiente e impressionante dessa face de Camilo frequentemente ignorada. São também do mais valioso que a literatura portuguesa de Oitocentos nos legou.

Abel Barros Baptista